GEOTECNOLOGIAS: SENSORIAMENTO REMOTO ALIADO AO MEIO AMBIENTE

Geotecnologia
Imagem aérea com curso hídrico e florestas ciliares

O futuro das geotecnologias, e neste contexto o sensoriamento remoto, é bastante promissor. As ciências naturais podem – e devem – seguir utilizando a seu favor a tecnologia.

No verão de 1858, Gaspar Félix Tournachon, balonista e fotógrafo francês, responsável – entre muitas outras coisas – pela fotografia póstuma de Dom Pedro II, subiu a 80 metros de altura e capturou a imagem da vila Petit-Becetre, na França. Gaspar, naquele momento, realizava a primeira fotografia aérea da história, e provavelmente não tinha a dimensão da importância que seu ato, no futuro, teria. A altitude fornece uma visão privilegiada dos aspectos locais, como nenhuma outra visada é capaz de fornecer. Muito antes da invenção dos aviões, balões, helicópteros e satélites, o ser humano, que até então sempre esteve com os pés no chão, curiosamente já confeccionava mapas através de uma perspectiva aérea, como se alguém, no céu, mirasse e desenhasse a Terra. Um século depois do feito de Tournachon, no ano de 1960, a humanidade já havia avançado o suficiente para lançar o primeiro satélite de observação da história, o TIROS-1 (Television Infra-Red Observation Satellite). Entretanto, naquela época, o imageamento da superfície terrestre era precário, pois os satélites eram projetados para estudar a atmosfera e, ainda que esse fim já seja importante para a preservação ambiental por conta da climatologia, o fato de o estudo da superfície ser o mais direto aspecto de análise das condições ambientais fazia com que os satélites ainda não apresentassem forte influência sobre a caracterização das condições ambientais. Entretanto, a partir dali já se podia entender o surgimento do Sensoriamento Remoto, que consiste na coleta, por parte de algum equipamento capaz de armazenar informações, de dados e de características de uma área ou objeto alvo específico na superfície da Terra. Nos anos subsequentes, surgiram satélites que – agora sim – tinham a função de fotografar a superfície, inicialmente para fins de estudos geológicos, mas que, a partir do sucesso de seu serviço, firmaram a ideia de que registros da superfície deveriam ser feitos de forma contínua e repetitiva. A partir de então, os mais diversos países passaram a integrar o Sensoriamento Remoto em suas agendas tecnológica e ambiental. Nos dias de hoje, com o avanço tecnológico abrangendo equipamentos dos mais diversos usos e tamanhos, para além dos satélites, como computadores, drones e telefones móveis, o leque de funções que as Geotecnologias podem realizar é notável. As imagens sistematicamente tiradas podem ser comparadas, o que proporciona o acompanhamento não somente do nível de preservação de áreas importantes para a humanidade, como, também, diagnosticar as principais frentes de impacto antrópico capazes de degradar, de alguma forma, a natureza, a se considerar a ciência das atividades humanas típicas em cada região do globo. Alguns satélites, como os Landsat 5 e 7, parte do reconhecido programa de observação da Terra desenvolvido pela NASA a partir de meados da década de 1960, possuem a característica de apresentar resolução espectral, que, em suma, trata-se do intervalo de comprimento de ondas inseridas no espectro eletromagnético. Portanto, seus sensores, que possuem sete bandas espectrais em comum (o Landsat 7 ainda possui uma oitava banda, chamada Pancromática), interpretam a energia eletromagnética receptada desses sete diferentes intervalos de comprimentos de onda dentro do espectro. Como esses comprimentos de onda são capazes, cada um, de analisar variados aspectos e características naturais em superfície, falar das bandas espectrais é uma ótima forma de entender o leque de informações que as geotecnologias são capazes de gerar. A primeira banda, que corresponde ao azul do espectro visível, é útil para estudos como a batimetria, por exemplo, pois penetra com facilidade em corpos d’água, além de apresentar efetividade na separação de solos expostos, recém utilizados na agricultura, e a vegetação nativa. A segunda banda, por sua vez, também apresenta boa penetração em drenagens, mas é mais indicada para a análise de sedimentos em suspensão, sendo capaz de mensurar quantidade e qualidade dos mesmos. A terceira banda corresponde ao intervalo espectral vermelho. É eficiente na diferenciação, através de contraste, entre áreas de vegetação densa e áreas de menor quantidade de vegetação, de solo exposto ou urbanizadas. Em regiões de pouca vegetação, ainda, é capaz de diferenciar variações de tipos de rochas ocorrentes. A quarta banda, do intervalo do infravermelho próximo, auxilia na determinação das linhas de costa, delimita com facilidade os limites dos corpos d’água, o que é fundamental para o mapeamento dos cursos hídricos. Como é sensível à morfologia do terreno, também serve como boa maneira de interpretar solos, geologia e geomorfologia, além das feições geoestruturais. A quinta banda, no infravermelho médio, revela-se como ótima ferramenta para determinar níveis de umidade no solo e nas plantas, além de ser capaz de atravessar nuvens finas que eventualmente possam obstruir o imageamento do solo. A sexta banda, do infravermelho termal, também serve, assim como a quinta, para estimar a umidade do solo. Entretanto, como apresenta sensibilidade a contrastes de temperatura, é indicada para a análise dos aspectos termais da água, dos solos, das rochas ou da vegetação. Por fim, a sétima banda, no intervalo infravermelho de ondas largas, apresenta valências da quarta, quinta e sexta banda, com sensibilidade à geomorfologia, solos, além do mapeamento de alteração hidrotermal. O leitor, ao perceber tamanha variedade de informações fundamentais que podem ser obtidas do espaço, pode se perguntar: “o excesso de informação disponibilizada em conjunto não pode atrapalhar – e até atrasar – a dinâmica da confecção de mapas?” Bem, softwares especializados em geotecnologias fazem, em algumas horas, mapas que os técnicos levavam dias, ou semanas, confeccionando durante a era do lápis e papel. Cálculos de áreas, ângulos, coordenadas e distâncias que antes ocupavam dias dos profissionais, hoje se resolvem com cliques. A pintura e a estética dos mapas se moldam de maneira automatizada às vontades do técnico de forma interativa e instantânea. Já no século XXI, com a chegada dos notebooks, smartphones e drones, serviços que demandem idas a campo em áreas específicas, com análise de maior detalhe, podem ser realizados de maneira mais rápida e eficaz, pois áreas que precisam de análise ou estudo, que antes eram remotas ou inacessíveis, como áreas de preservação ambiental ou pedreiras de elevadas alturas, hoje podem ser exploradas, monitoradas ou fotografadas de forma aérea, sendo muitos dos dados armazenados, processados e visualizados nos celulares dos operadores, em local seguro. Por fim, o futuro das geotecnologias, e neste contexto o sensoriamento remoto, é bastante promissor. As ciências naturais podem – e devem – seguir utilizando a seu favor a tecnologia. Novos softwares e projetos ambientais, terão a tendência de evoluir cada vez mais para esse sentido, especialmente com o surgimento da Inteligência Artificial. Outro ponto a ser visualizado é o barateamento dos custos, que vão desde deslocamentos em campo à democratização de novos produtos tecnológicos e, consequentemente, de seus frutos para a natureza, para a sociedade e para o Planeta Terra. Artigo escrito por: João Vitor Pfeifer Machado - Geólogo (profissional do quadro permanente da Jacuhy Consultoria Ambiental).